Por Wolfgang Münchau
O Fundo Monetário Internacional (FMI) alocou 91% de seus compromissos definitivos para programas na Europa. Mas existe agora sobre a mesa de negociações uma proposta que sugere que esse montante não é suficiente e deveria ser ampliado significativamente. Será justificado um aumento dos fundos do FMI para socorrer a zona do euro? Em especial, deveriam países fora da zona euro participar da captação desse novo capital? Penso que não.
O FMI está certo, é claro, em concluir que a crise da zona do euro é o principal risco com que agora se defronta a economia mundial. O mundo tem um forte interesse na solução da crise. Mas um envolvimento maior do FMI em programas específicos da União Europeia não é necessário, sendo, muito possivelmente, contraproducente.
O envolvimento não é necessário porque a zona do euro tem capacidade financeira para ajudar a si mesma. A região como um todo tem um pequeno superávit em sua balança corrente com o resto do mundo. Como resultado disso, a região não depende de financiamentos externos. A região tem seu próprio banco central, que pode, ao menos em tese, agir como um emprestador de última instância.
A zona do euro opera, como sabemos, sob limitações políticas e jurídicas, tais como as regras para déficits determinadas pelo tratado de Maastricht, a regra que proíbe socorros financeiros ou as regras que impedem o Banco Central Europeu de financiar governos.
No entanto, um observador externo teria razão em afirmar que essas regras são, todas, autoimpostas, e, portanto, reversíveis. A zona do euro deveria mudar suas regras, antes de rastejar até outros países, de chapéu na mão.
Considerando que a zona do euro é economicamente irrestrita e uma das regiões mais ricas do mundo, o pedido para envolvimento do FMI em hipotéticas operações de socorro futuro é moralmente repreensível. O que está acontecendo, nesse caso, é que os Estados membros da zona do euro têm dificuldade para comprometer fundos adicionais às operações de socorro e acreditam ser politicamente mais conveniente canalizar recursos por meio do FMI como uma forma de driblar parlamentos nacionais.
Mas, em minha opinião, existe um argumento ainda mais importante. A forma como os Estados membros da zona do euro têm lidado com a crise ampliou as chances de um resultado catastrófico. Uma extensão do engajamento do FMI muito provavelmente apoiará as políticas atuais.
A recessão em desenvolvimento é, em grande medida resultado de uma elevação prematura das taxas de juro pelo BCE, de uma resposta hesitante à crise, da não recapitalização do setor bancário após a crise financeira de 2008 e de uma reação instintiva em política fiscal pró-cíclica. O novo governo espanhol admitiu na semana passada não haver nenhuma possibilidade de que possa cumprir a meta de 4,4% do Produto Interno Bruto (PIB) para o déficit deste ano, estabelecida numa época em que as autoridades podiam fingir que a economia iria se recuperar. A Itália já apertou a política fiscal apesar da recessão e também a Espanha ficará sob pressão para fazê-lo. Todo mundo está seguindo os passos da Grécia.
Os erros acumulados de política econômica na zona do euro estão transformando um aperto de liquidez numa crise de solvência. E aqui reside um risco grave para o FMI. Se a Itália ficar enredada em uma recessão prolongada, crescerá significativamente a probabilidade de que não seja capaz de pagar sua dívida, atualmente em 120% do PIB. Notícias da Itália sugerem que o FMI está prestes a prever uma recessão de dois anos para o país, o que poderá muito bem resultar em um aumento da proporção da dívida em relação ao PIB. A solvência futura da Itália é inteiramente dependente das taxas de juro de mercado e da perspectiva de um retorno a um crescimento econômico forte e sustentável.
Tenho dificuldades para ver como isso pode ser feito sem uma união fiscal e um compartilhamento bem maior dos encargos.
Existem argumentos técnicos adicionais que favoreceriam um envolvimento mais cauteloso do FMI. Mario Blejer, ex-presidente do banco central da Argentina, argumentou recentemente que o status de credor preferencial do FMI poderia tornar-se um problema, pois um empréstimo do FMI subordinaria automaticamente todos os outros detentores de títulos. A probabilidade de um default envolvendo esses títulos possivelmente impagáveis é, portanto, significativamente maior. Além disso, a situação poderia tornar-se tão grave que a senioridade do FMI poderia não se sustentar, o que por sua vez colocaria em risco sua capacidade de emprestar a juros baixos.
Existem várias propostas na mesa sobre a forma de envolver o FMI de maneira inteligente. Mas todas estão sujeitas ao mesmo problema. Qualquer tipo de ajuda de liquidez externa incentivaria a zona euro a seguir em frente com as políticas que estão agravando a crise.
A melhor contribuição que o FMI poderia fazer, portanto, é não envolver-se em outros programas além daqueles com que já se comprometeu. Se tiver de se envolver, deveria ao menos tentar condicionar quaisquer engajamentos adicionais a mudanças fundamentais de política econômica, tanto em nível nacional como da zona do euro. Em particular, o FMI deveria insistir em um grau mínimo de gestão econômica coletiva na abordagem de algumas das questões básicas, como a fragilidade do setor bancário e as políticas visando eliminar a interdependência dos bancos nacionais com os governos nacionais. Seria imprudente o FMI envolver-se nesses debates. (Tradução de Sergio Blum)
Wolfgang Münchau é editor e escreve sobre economia europeia no FT.
Fonte: Valor Econômico
http://www.valor.com.br/opiniao/2499698/por-que-o-fmi-deve-ficar-longe-da-europa?utm_source=newsletter_manha&utm_medium=24012012&utm_term=por+que+o+fmi+deve+ficar+longe+da+europa&utm_campaign=informativo&NewsNid=2498946
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