Empresas devem prevenir a disseminação do vírus no local de trabalho e guardar documentos que comprovem esse cuidado
Por Adriana Aguiar — De São Paulo
Marcos Alencar:
questionamentos por parte dos que adoeceram gravemente e dos familiares dos que
se foram — Foto: Ruy Baron/Valor
Com a decisão
do Supremo Tribunal Federal (STF) que dá margem para a covid-19 ser considerada
doença ocupacional, empresas correm o risco de responder na Justiça a pedidos
de indenização por danos morais e materiais. As ações podem ser propostas por
empregados atingidos na forma mais grave da doença ou por familiares.
Funcionários
afastados pela Previdência Social por mais de 15 dias para tratamento, têm
estabilidade de um ano e direito ao FGTS no tempo de licença. As companhias
podem também sofrer impacto no caixa (leia mais abaixo) com o aumento do Fator
Acidentário de Prevenção (FAP).
O conselho de
especialistas às empresas é cautela. Com o fim da quarentena em diversos
municípios e a volta ao trabalho presencial, as companhias devem prevenir a
disseminação do vírus no local de trabalho e guardar documentos que comprovem
esse cuidado, segundo advogados trabalhistas. As companhias devem seguir as
regras da Organização Mundial de Saúde (OMS) e protocolos governamentais sobre
covid-19.
O Supremo já
recebeu 2.682 processos relacionados à pandemia da covid-19. Já foram
proferidas mais de 2,4 mil decisões dos mais diversos assuntos que envolvem a
doença, segundo dados do Painel de Ações Covid, implementado no site do
tribunal.
No dia 29 de
abril, ao derrubar o artigo 29 da Medida Provisória (MP) n° 927, segundo o qual
a covid-19 não é doença ocupacional, o STF possibilitou que funcionários
contaminados possam responsabilizar empresas pela doença, se comprovado que ela
foi contraída no ambiente de trabalho.
Caberá às
empresas demonstrarem nos processos que tomaram medidas preventivas. A decisão
foi proferida no julgamento de pedido de liminar em sete ações diretas de
inconstitucionalidade (ADIs) ajuizadas contra a MP. Segundo os ministros, o
artigo prejudicaria inúmeros trabalhadores de atividades essenciais e de risco
que estão constantemente expostos à doença, por não considerá-la acidente de
trabalho.
A advogada
Cássia Pizzotti, sócia do Demarest Advogados, afirma estar preocupada com os
desdobramentos dessa decisão. Segundo ela, já existem sindicatos exigindo a
emissão de Comunicado de Acidente do Trabalho (CAT) nos casos de funcionários
afastados pela covid por mais de 15 dias e, com isso, dá-se a entender que a
empresa assumiu a responsabilidade pela contaminação.
Ela explica
que na seara trabalhista ainda caberá ao Tribunal Superior do Trabalho (TST)
definir como será a responsabilização. O tribunal determinará se existe
responsabilidade objetiva decorrente do negócio, independentemente de
comprovação de culpa. Ou se há responsabilidade subjetiva. Nesse caso, se a
empresa provar que seguiu todas as recomendações de saúde, como fornecimento de
máscaras e álcool em gel, troca de turnos ao ar livre, cuidados na higiene do
refeitório, entre outras medidas, poderá se eximir de condenação.
“A doença do
trabalho está ligada a uma condição do ambiente de trabalho. Neste caso, não
tem como afirmar que o funcionário pegou covid na companhia”, afirma. A
advogada acrescenta que não dá para responsabilizar a empresa por algo que é
pandêmico, pois as pessoas podem pegar a doença em qualquer lugar, inclusive na
própria casa.
A
caracterização da covid como doença do trabalho também tem ocorrido em outros
países segundo Cassia. A Alemanha e a Itália consideram como doença de trabalho
apenas para profissionais da saúde. Canadá também reconhece ser doença
ocupacional, desde que exista laudo. A Argentina também admite como doença do
trabalho de forma mais ampla.
Para evitar a
responsabilização, Cassia afirma que as companhias estão desenvolvendo
protocolos, com auxílio de autoridades médicas, que devem ser seguidos para
evitar o contágio. O ideal, segundo ela, é existir uma iniciativa do governo
federal, assim como ocorreu nos Estados Unidos, que eleja os requisitos que
devem ser cumpridos pelas empresas para afastar a responsabilidade. “Nos
Estados Unidos e no Reino Unido, funcionários se recusaram a voltar ao trabalho
e por isso o governo criou essas medidas preventivas”, diz.
O advogado
Marcos Alencar afirma que, diante da decisão do Supremo de abril e de outra
decisão de 2009 que declarou a responsabilidade objetiva por acidente de
funcionário de empresa de segurança, as empresas precisam de provas
contundentes para se defenderem. “Passada a pandemia, teremos muitos questionamentos
por parte dos que adoeceram gravemente e dos familiares dos que lamentavelmente
se foram”, diz.
Entre as
provas que devem ser guardadas, o advogado destaca o registro de aquisição em
maior volume, se comparado a antes de março deste ano, dos produtos de higiene
e o acatamento de “autodeclaração” de empregados com sintomas de covid-19,
evitando assim o contágio com os demais empregados. Além disso, a demonstração
de contratação de transporte individual ou específico, para evitar que os
empregados utilizassem transporte público de passageiros é uma prova
importante.
Os documentos
de aquisição de máscaras, luvas, óculos de proteção e vídeos ou fotos de
treinamentos de como utilizar os equipamentos de segurança também devem ser
arquivados. Ele também recomenda reuniões semanais da Cipa (que podem ser
virtuais) para esclarecer o passo a passo das medidas de contenção da doença,
entre outros esclarecimentos.
Fonte: Valor Econômico
Veja
Nenhum comentário:
Postar um comentário