
O homem peludo que parece um macaco olha demoradamente para o osso do esqueleto ressecado pelo sol do deserto escaldante. Ele balança a cabeça lentamente e depois coça sua têmpora direita como se isso o ajudasse a pensar. Aliás, é isso que ele está aprendendo a fazer: pensar. Seu cérebro está se desenvolvendo, o que lhe dá uma vantagem. De repente, o homem peludo agarra um osso, estica o braço e percebe que é como se este tivesse ficado mais longo. Então, ele bate em outro osso e o quebra.
A cena descrita acima faz parte do início de um filme genial,
2001: Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick, baseado no livro de Arthur Clarke. O enredo é futurista, mas seu começo é ambientado no passado, mostrando a vida de nossos ancestrais, possivelmente dos Australopithecus, que viveram na África há cerca de 3 milhões de anos.
Aquele hominídeo sai então batendo com o osso – que ele tinha acabado de transformar em uma arma – quebrando coisas e matando animais. Na cena seguinte, ele comanda seus companheiros, cada um com um osso na mão, para conquistar uma poça de água, até então dominada por outro bando mais numeroso.
Aquele homem primitivo foi um líder porque viu no osso algo mais que um osso – líderes são assim, veem algo mais do que o óbvio. Também foi um líder porque compartilhou seu conhecimento (ou sua visão) com os demais de seu grupo; deu o exemplo, e foi, naturalmente, seguido pelos demais. Se ele não era o chefe, passou a ser, pois foi um líder naquela situação.
Além do filme de Kubrick, milhares de outros já exploraram o tema da liderança. Trata-se de um dos enredos de maior sucesso, junto com o amor, o sofrimento e o humor. E há uma explicação para isso: as pessoas precisam de líderes.
Liderança não é cargo. Quando alguém diz que é gerente, diretor, presidente, está se referindo a seu cargo, o que não significa que ele seja um líder. Ser líder não é ocupar uma função de mando, e sim ter uma postura, um comportamento específico, que lhe dá o poder de inspirar outras pessoas a dirigir seus esforços em direção a uma causa comum.
Sempre que há um grupo de pessoas (e não importa quantas, podem ser mil ou apenas duas), alguém está liderando. Nos lares, nas empresas, nas equipes desportivas e até na rua, há momentos em que acontecem coisas que exigem que alguém tome a iniciativa. Quando há uma pessoa que ocupa um cargo, espera-se que a iniciativa seja dela e, se isso não acontecer, temos um problema, pois as pessoas ficam à deriva, sem concentrar seus esforços. Até que alguém comece.
Em uma cidade da índia, uma árvore cai, interrompendo o trânsito. As pessoas aprisionadas por aquela situação se enervam, algumas se desesperam, e todas se limitam a reclamar ou se acomodar, esperando as providências das autoridades. Para complicar, começa a chover. É quando um menino, que observava a cena da janela do ônibus, desce e encaminha-se resoluto até o tronco atravessado na rua e começa, inutilmente, a empurrá-lo. Inutilmente? A cena que se segue é impressionante: outros garotos se juntam a ele, depois alguns rapazes fortes e, de repente, como mágica, o tronco é removido.
Esse vídeo pode ser visto no YouTube e mostra um exemplo espetacular de liderança. O garoto não tinha nenhuma autoridade legal, mas demonstrou um imenso poder moral. A propósito, quando tudo acaba, dois policiais que dormiam em uma viatura acordam surpresos.
Liderança é isso, é a capacidade de inspirar cada pessoa a colocar sua força de modo conjunto na realização de uma tarefa, que pode ser algo simples, corriqueiro, ou pode ser uma missão grandiosa, uma causa. Não importa a dimensão, líderes são necessários. Felizmente cada pessoa carrega dentro de si a potência para se transformar em um líder, dependendo apenas de duas coisas, da necessidade e da vontade.
Mas sempre é bom lembrar que liderar uma situação significa liderar pessoas, e que ninguém lidera outros se, primeiro, não liderar a si mesmo. Esta é a sequência da liderança: primeiro lidero o eu, depois o outro, finalmente o contexto.
Nelson Mandela, em momentos de desesperança na prisão, costumava repetir os versos de William Henley: "Eu sou o senhor de meu destino, o capitão de minha alma". Ele não tinha cargos. Aliás, tinha, era um presidiário. E, mesmo assim, liderou a impressionante mudança de uma nação.
Eugênio Mussak
Fonte:
http://eugeniomussak.com.br/wp-content/uploads/20_Filosofias.pdf
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