O ano era 2006. Tiago Dalvi começou a reparar no talento dos artesãos brasileiros, que criavam produtos de qualidade a preços competitivos. O único problema é que eles não faziam ideia de como vendê-los. Assim nasceu a empresa social Solidarium Comércio Justo, que leva produtos artesanais para grandes redes varejistas.
Dalvi, 26 anos, lembra as dificuldades no início do empreendimento. "Comecei com aquela intenção inocente de mudar o mundo, tropecei muito mas aprendi com os erros", relata. O primeiro alvo do empreendedor foi a rede Walmart. Foram precisos seis meses para que ele conseguisse passar da secretária. Um dia, um dos diretores ligou para marcar uma reunião. Dalvi encheu duas malas de produtos e foi correndo para o encontro. Em um primeiro momento, conseguiu vender apenas para uma loja, depois passou a negociar com 56. "Foi uma vitrine que ajudou a abrir portas", afirma. A Solidarium ganha uma comissão de 10% sobre cada transação e faturou R$ 450 mil no ano passado.
Não é ONG. Não é filantropia. A empresa social tem CNPJ como outra qualquer, paga impostos e dá lucro. Na verdade, em alguns casos, muito lucro. Os empresários do setor explicam que é importante se manter sem o apoio financeiro do governo ou de terceiros. A independência é a maneira mais eficaz de fazer a diferença em larga escala - uma das principais características desse tipo de negócio - e de forma sustentável.
As empresas sociais avançam em ritmo acelerado no mundo todo. Em países europeus e nos Estados Unidos, já há quem diga que em pouco tempo todas as companhias nascerão híbridas, isto é, terão a vocação social em sua essência. Muitos dos especialistas e profissionais que trabalham no setor criticam o fato de a área de responsabilidade social das empresas ser separada, como se fosse um apêndice e não uma parte efetiva do negócio.
O Brasil surge como uma referência do setor, na visão de especialistas, e com uma característica peculiar: por aqui, as empresas sociais são comandadas por jovens. Entre os donos de negócios tidos como promissores, há pessoas com 20 e poucos anos. "O país possui gente bem formada e talentosa. Além disso, tem muitos desafios sociais para superar", afirma Daniel Izzo, sócio da Vox Capital, fundo de venture capital que só investe em negócios de impacto social.
No exterior, Dalvi está fazendo história. A Solidarium foi eleita uma das cinco maiores inovações do mundo para o desenvolvimento socioeconômico. Ela concorreu com 900 negócios de 83 países em uma competição da Fundação eBay em parceria com a Ashoka.
O empresário enxerga longe. "Depois de mudar a realidade dos nossos artesãos e de outros da América Latina, vamos expandir o negócio para a China e a Índia, que enfrentam problemas parecidos. Em 2013, estaremos lá fora", garante Dalvi.
Izzo, da Vox, comenta que o que chama mais atenção é que esta geração "não acha esquisito unir impacto social com lucro". Eles têm ainda uma vantagem em relação às gerações anteriores - o ambiente propício ao empreendedorismo. Com a estabilidade da economia brasileira, eles podem se dar ao luxo de buscar menos segurança no início da carreira e fazer algo que dê sentido às suas vidas. "Os jovens cada vez mais unem o trabalho a um propósito", afirma Izzo.
O investidor lembra ainda que crescem os eventos de empreendedorismo social, os mentores, os fundos de investimentos e as aceleradoras- empresas que fazem um trabalho parecido com as incubadoras, a diferença é que seu foco está no desenvolvimento do modelo de negócio.
O próprio Daniel Izzo tinha 32 anos quando criou a Vox, em 2009. Mas a história começou mesmo quando ele tinha 28, trabalhava na Johnson & Johnson como gerente de produto de Sundown e teve uma crise de origem profissional. "Eu não tinha como métrica aumentar o número de pessoas que se beneficiavam do protetor solar, e sim o lucro. Mas acho que a finalidade dos negócios deve ser tornar a vida melhor", afirma.
Um dos negócios de impacto social no portfólio da Vox Capital é o Banco Pérola, que concede microcrédito a jovens excluídos do sistema financeiro. Alessandra Gonçalves de França, diretora-presidente da entidade, cuja sede fica na cidade de Sorocaba, em São Paulo, tinha 16 anos quando leu o livro "O banqueiro dos pobres", de Muhammad Yunus. Nele, o pai do microcrédito, que em 2006 ganhou o prêmio Nobel da Paz, relata a criação de um banco para emprestar dinheiro à população carente. "Encantei-me com a história de Yunus", afirma a empreendedora.
O Banco Pérola é uma Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) que funciona sob a coordenação dos Ministérios da Justiça e do Trabalho e Emprego, no âmbito do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado.
O modelo de negócio do Pérola surgiu a partir de uma pesquisa, que mostrou que 3,9 milhões de jovens no país sonham em empreender, mas não têm acesso a crédito. A vocação de Alessandra para o empreendedorismo social surgiu cedo, já que ela trabalha no terceiro setor desde os 15 anos. Hoje ela coleciona casos que graças a ela tiveram desfechos positivos. "Por exemplo, dois jovens que catavam lixo nas ruas para reciclar tomaram um empréstimo conosco e atualmente ganham R$ 10 mil por mês com uma empresa de reciclagem", conta.
Tony Marlon, 24 anos, também optou pela carreira de empreendedor social. Em 2011, fundou no bairro de Campo Limpo, na periferia de São Paulo, a Escola de Notícias, uma produtora sociocultural que trabalha com a formação de jovens em comunicação e geração de conteúdo. "Pedi demissão dos dois empregos, comprei três computadores, uma filmadora e transformei a casa dos meus pais em sede", conta. "Para mim, a comunicação tem três papéis fundamentais: informar, inspirar e mobilizar."
O próprio Marlon conseguiu se formar e trabalhar por conta de projetos sociais dos quais participou. "O que me faz levantar todos os dias é a possibilidade de fazer de fato algo para mudar as coisas", afirma.
Fonte: Valor Econômico
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